Nota informativa – Advocacia pelos servidores do IBAMA

Prezados(as) associados(as), bom dia

Espero que estejam bem.

Em atenção à demanda apresentada, o Torreão Braz Advocacia elaborou a Nota Jurídica anexa para tratar das situações de incompatibilidade da advocacia pelos servidores do IBAMA. Na Nota Jurídica, busca-se tratar tanto da Consulta analisada pela OAB/DF quanto da decisão, proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, a respeito da incompatibilidade do exercício da advocacia por servidores públicos que exercem atividades de polícia administrativa, haja vista a interligação dos temas, a se confirmar quando da disponibilização do inteiro teor da Consulta pela OAB/DF.

 

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DA CARREIRA DE ESPECIALISTA EM MEIO AMBIENTE E DO PLANO ESPECIAL DE CARGOS DO MMA E DO IBAMA – PECMA, NO DISTRITO FEDERAL, ASIBAMA-DF, solicitou a elaboração de nota jurídica para tratar da legalidade da cumulação dos cargos públicos da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA com o exercício da advocacia privada. Isso porque, de acordo com comunicações recebidas pela Consulente, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Distrito Federal, OAB/DF, consultou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, IBAMA, para obter elementos de informação quanto à natureza das atividades desenvolvidas pelos servidores do órgão.

 

De acordo com o Oficio n. 49/2023/COGER, o Corregedor-Chefe do IBAMA informou à OAB/DF as atribuições previstas em lei para os cargos de Analista Ambiental, Técnico Ambiental, Analista Administrativo e Técnico Administrativo, frente a informação de que o “voto da Conselheira afirmou, de modo geral, que TODOS OS CARGOS DO IBAMA exercem poder de polícia administrativa ambiental” (grifos do texto).

É necessário destacar, a título preliminar, que já foi requerido acesso ao inteiro teor da Consulta n. 07.0000.2023.000254-1, em trâmite na OAB/DF, mas que, até a data de conclusão da presente Nota Jurídica, o órgão não encaminhou os termos da eventual decisão para conhecimento das razões e das eventuais conclusões adotadas pela OAB/DF. Nesse contexto, o presente parecer jurídico busca explorar as situações de incompatibilidade e de impedimento para o exercício da advocacia por servidores públicos, em especial, por integrantes da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA.

I – LIMITAÇÕES LEGAIS AO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
A regras deontológicas aplicáveis ao exercício da advocacia, no Brasil, estão previstas na Lei n. 8.904/1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil.

Em seu Capítulo VII estão previstas as situações de incompatibilidade e de impedimento para o exercício da advocacia. Por incompatibilidade, a lei estabelece a proibição total das atividades, ao passo que no impedimento há apenas limitação do exercício da advocacia (ou seja, restrição parcial).

As hipóteses de incompatibilidade estão previstas no art. 28 da lei, cujo rol é taxativo e, por isso, não comporta interpretação ampliativa para abarcar outras situações que não estejam ali previstas:

Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades:
I – chefe do Poder Executivo e membros da Mesa do Poder Legislativo e seus substitutos legais;
II – membros de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais, da justiça de paz, juízes classistas, bem como de todos os que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta;
III – ocupantes de cargos ou funções de direção em Órgãos da Administração Pública direta ou indireta, em suas fundações e em suas empresas controladas ou concessionárias de serviço público;
IV – ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário e os que exercem serviços notariais e de registro;
V – ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza;
VI – militares de qualquer natureza, na ativa;
VII – ocupantes de cargos ou funções que tenham competência de lançamento, arrecadação ou fiscalização de tributos e contribuições parafiscais;
VIII – ocupantes de funções de direção e gerência em instituições financeiras, inclusive privadas.
§ 1º A incompatibilidade permanece mesmo que o ocupante do cargo ou função deixe de exercê-lo temporariamente.
§ 2º Não se incluem nas hipóteses do inciso III os que não detenham poder de decisão relevante sobre interesses de terceiro, a juízo do conselho competente da OAB, bem como a administração acadêmica diretamente relacionada ao magistério jurídico. […]

Já as situações de impedimento, isto é, de limitação parcial do exercício da advocacia, estão previstas no art. 30 e aplicam-se a todos os servidores públicos em atividade:

Art. 30. São impedidos de exercer a advocacia:
I – os servidores da administração direta, indireta e fundacional, contra a Fazenda Pública que os remunere ou à qual seja vinculada a entidade empregadora;
II – os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis, contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público.
Parágrafo único. Não se incluem nas hipóteses do inciso I os docentes dos cursos jurídicos.

Como adiantado, todos os servidores públicos são impedidos de exercer a advocacia contra a Fazenda Pública que os remunera, o que, no caso dos servidores vinculados ao IBAMA, significa dizer que não poderão advogar contra o IBAMA e contra a União, suas autarquias, fundações e empresas públicas, já que o termo “Fazenda Pública”, na hipótese, abrange a entidade pagadora direta e indireta (ou seja, em âmbito Federal).

Já as situações de incompatibilidade são as que demandam maior atenção na presente análise jurídica, uma vez que a sua configuração impede, de forma total, o exercício da advocacia pelos servidores públicos enquadrados naquelas situações.
À exceção das hipóteses previstas nos incisos II (in fine) e V, as situações de incompatibilidade previstas no art. 28 do Estatuto da Advocacia são de fácil identificação pelo mero cargo ocupado pelo agente público ou privado, já que dizem respeito a integrantes do Poder Judiciário (juízes e servidores); Poder Executivo (Presidente, Governadores e Prefeitos); Poder Legislativo (integrantes da Mesa diretiva no âmbito Federal, Estadual, Municipal ou Distrital); Ministério Público da União (promotores, procuradores e demais servidores); agentes públicos que prestam serviços cartorários; servidores públicos detentores de cargos em comissão (chefia e assessoramento superiores); militares; auditores fiscais; e gerentes e diretores de bancos ou financeiras.

A problemática recai na identificação dos casos em que há exercício de (i) “função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta” (inciso II, in fine) e (ii) “ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza” (inciso V).

No primeiro caso, a problemática surge a partir de cargos que exercem funções finalísticas de órgãos de controle, não obstante tal exercício não tenha a capacidade per se de habilitar o detentor do cargo a participar de julgamentos em órgãos de deliberação coletiva. Nesses casos, o exercício administrativo judicante é realizado por servidores investidos em funções de direção, fato que já incompatibiliza tais agentes ao exercício concomitante da advocacia.

Já no segundo caso, relativo à manifestação da atividade policial de qualquer natureza, há incompatibilidade patente do exercício da advocacia por agentes da Polícias Civis e das Polícias Federais (Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Ferroviária Federal).

No entanto, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado sob a sistemática dos recursos repetitivos (isto é, vinculante aos demais casos judiciais em tramitação), a incompatibilidade prevista no inciso V do art. 28 da Lei n. 8.906/1994 alcança também os demais agentes públicos que exercem poder de polícia administrativa:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA DE NATUREZA REPETITIVA. OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO DE AGENTE DE TRÂNSITO. INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. INCOMPATIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO ART. 28, V, DA LEI 8.906/94. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ. TESE FIRMADA SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. […] V. O art. 28, V, da Lei 8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), determina que a advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, para os ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza. Assim, ao utilizar a expressão “atividade policial de qualquer natureza”, o texto legal buscou abarcar todos aqueles que exerçam funções compreendidas no poder de polícia da Administração Pública, definido no art. 78 do CTN.
Referido posicionamento tem sido adotado pela jurisprudência do STJ, que, ao apreciar caso envolvendo ocupante do cargo de Fiscal Federal Agropecuário – no qual se sustentava, tal como no presente processo, que a incompatibilidade para o exercício da advocacia, prevista no art. 28, V, da Lei 8.906/94, estaria restrita aos órgãos mencionados no art. 144 da CF/88, relacionados à segurança pública, descabendo interpretação extensiva, para abranger agentes públicos com poder de polícia administrativa -, decidiu que o exercício de tal cargo, “por compreender prerrogativas e atribuições de fiscalização, autuação, apreensão e interdição, atividades típicas de polícia administrativa, com poder de decisão sobre interesses de terceiros, é incompatível com o exercício da advocacia. (…) Afinal, conferir vedação apenas à ‘atividade policial’ no âmbito da segurança pública não se coaduna com a extensão prevista na norma em análise pela expressão ‘de qualquer natureza’. Ademais, a finalidade da norma, à toda evidência, é obstar a prática da advocacia por agente público que, exercendo atividade de polícia, possa se beneficiar da sua atuação funcional, vulnerando as suas atribuições administrativas e/ou gerando privilégio na captação de clientela, mormente se considerado o poder de decisão que detém, com base no cargo que exerce, sobre os administrados” (STJ, REsp 1.377.459/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 27/11/2014). Em igual
sentido: STJ, REsp 1.703.391/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2017; REsp 1.453.902/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 23/08/2017;
AgInt no REsp 1.818.379/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHAES, SEGUNDA TURMA, DJe de 29/11/2019. […] VIII. Inconteste, assim, que os agentes de trânsito desempenham atividades incompatíveis com o exercício da advocacia, porquanto ocupam cargos “vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza”, tal como previsto no art. 28, V, da Lei 8.906/94, exercendo funções que condicionam o uso, o gozo e a disposição da propriedade e restringem o exercício da liberdade dos administrados no interesse público, na forma do art. 78 do CTN, além de preservarem eles a “ordem pública e a incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas”, na fiscalização do trânsito, integrando os órgãos responsáveis pela segurança pública, previstos no art. 144 da CF/88 (art. 144, § 10, da CF/88 e art. 9º, § 2º, XV, da Lei 13.675/2018). […] X. Tese jurídica firmada: “O exercício da advocacia, mesmo em causa própria, é incompatível com as atividades desempenhadas por servidor ocupante de cargo público de agente de trânsito, nos termos do art. 28, V, da Lei 8.906/94.”
XI. Recurso Especial conhecido e provido, para, reformando o acórdão recorrido, denegar a segurança.
XII. Recurso julgado sob a sistemática dos recursos especiais representativos de controvérsia (art. 1.036 e seguintes do CPC/2005 e art. 256-N e seguintes do RISTJ).
(STJ, Primeira Seção, REsp n. 1.815.461/AL, Relatora Ministra Assusete Magalhães, julgado em 10.2.2021, DJe de 29.3.2021)

Embora o paradigma julgado pelo STJ tenha sido restrito aos agentes de trânsito, o inteiro teor de seu julgamento e o excerto destacado da ementa revelam que a interpretação vinculante da corte alcança demais servidores que exerçam atribuições enquadradas como manifestação do poder de polícia administrativa.

Nesse contexto, é preciso avançar à análise da natureza das atividades desempenhadas pelos servidores do IBAMA a fim de caracterizar ou não a sua subsunção às hipóteses de incompatibilidade previstas nos incisos II (in fine) e V do art. 28 do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil.

II – IBAMA. PROCESSO SANCIONADOR AMBIENTAL E A NATUREZA DAS ATIVIDADES DESEMPENHADAS PELOS ANALISTAS E TÉCNICOS AMBIENTAIS

O IBAMA, autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, foi criado pela Lei n. 7.735/1989, cujo art. 2º dispõe tanto sobre a natureza jurídica da entidade quanto sobre as suas finalidades:

Art. 2º É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de:
I – exercer o poder de polícia ambiental;

II – executar ações das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental, observadas as diretrizes emanadas do Ministério do Meio Ambiente; e
III – executar as ações supletivas de competência da União, de conformidade com a legislação ambiental vigente.

O IBAMA compõe o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) na qualidade de órgão executor, de forma que lhe compete executar e fazer executar a política e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente, de acordo com as respectivas competências (art. 6º, IV, da Lei n. 6.938/1981), quais sejam, de fiscalizar e exercer a função de polícia ambiental.

Justamente por isso é que os seus agentes, quando designados para as atividades de fiscalização, podem lavrar autos de infração ambiental, nos termos do art. 70, § 1º, da Lei n. 9.605/1998:

Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.

A designação para o exercício das atividades de fiscalização ambiental pode recair nos ocupantes dos cargos tanto de Analista Ambiental quanto de Técnico Ambiental,2 ambos integrantes da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Lei n. 10.410/2002).

Tal designação ocorre por ato do Presidente da autarquia (passível de delegação ao chefe da Diretoria de Proteção Ambiental, Dipro), precedida de capacitação específica do servidor, que passará a desempenhar a “atribuição” de Agente Ambiental Federal, conforme os arts. 221 e 222 da Portaria n. 92, de 14 de setembro de 2022 (aprova o Regimento Interno do IBAMA):

Art. 221. Para o exercício da fiscalização ambiental, o servidor será designado pelo Presidente do Ibama, por meio de portaria, em consonância com o disposto no § 1º do Art. 70 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e com o parágrafo único do Art. 6º da Lei nº 10.410, de 11 de janeiro de 2002, com a redação atribuída pela Lei nº 11.516, de 28 de agosto de 2007.
§ 1º A designação para o exercício da fiscalização ambiental deverá ser precedida por capacitação específica dos servidores.
§ 2º A dispensa do exercício da fiscalização ambiental também deverá ser realizada pelo Presidente do Ibama, por meio de portaria.
§ 3º O Presidente do Ibama poderá delegar a função de designação e dispensa dos servidores para o exercício da fiscalização ambiental ao diretor da Dipro.
Art. 222. O servidor designado para a fiscalização ambiental exercerá a atribuição denominada de Agente Ambiental Federal – AAF.

Como destacado, aos servidores designados para o exercício da fiscalização ambiental recaem as atribuições de lavratura do auto de infração administrativa ambiental com a indicação da imposição de sanção administrativa e aplicação, liminar, de medidas administrativas cautelares, conforme previsto no art. 15 da Instrução Normativa Conjunta MMA/IBAMA n. 1, de 12 de abril de 2021, que regula o processo administrativo sancionador no âmbito do IBAMA:

Art. 15. Constatando a ocorrência de infração administrativa ambiental, demonstrada em relatório de fiscalização, nos termos do capítulo anterior, o agente ambiental federal designado para atividades de fiscalização lavrará auto de infração em termo próprio por meio do qual indicará a imposição de sanções e formalizará a aplicação de medidas administrativas cautelares, a seguir especificadas:
I – advertência;
II – multa simples; III – multa diária;
IV – apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora e demais produtos e subprodutos objeto da infração, instrumentos, petrechos, equipamentos, veículos e embarcações de qualquer natureza utilizados na infração;
V – destruição ou inutilização do produto ou bem; VI – suspensão de venda e fabricação do produto;

VII – embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas; VIII – demolição de obra;
IX – suspensão parcial ou total das atividades; e X – restritiva de direitos.
§ 1º O auto de infração deverá necessariamente ser lavrado pelo agente ambiental federal que elaborou o relatório de fiscalização.
§ 2º Após a lavratura do auto de infração, o agente o encaminhará à autoridade hierarquicamente superior para, sucessivamente, sanear e abrir o processo administrativo de apuração de infração ambiental.
[…] § 5º Cumprido o trâmite estabelecido pela Seção II, do presente Capítulo IV, o chefe da unidade administrativa ambiental federal do local da infração, após o recebimento do processo administrativo, instrumentalizado pelo auto de infração regularmente emitido e a notificação do autuado, deverá envia-lo no prazo máximo de 2 (dois) dias ao Nucam para o início da fase de conciliação ambiental.

É prudente observar que a lavratura do auto de infração não encerra, senão inicia, o processo administrativo sancionador, cuja exigibilidade (ou autoexecutoriedade) da sanção dependerá da conclusão das demais etapas do processo sancionador ambiental (v.g., conciliação ambiental, impugnação ao auto de infração, produção de provas, julgamento e recurso).

Nesse contexto, a competência de julgamento recai ao Superintendente Estadual do IBAMA (em primeira instância) e ao Presidente do IBAMA (em grau recursal), cargos de direção que incompatibilizam os seus ocupantes ao exercício concomitante da advocacia (inciso III do art. 28).

Logo, a lavratura de autos de infração não pode ser assimilada à atividade de julgamento de apelos (inciso II, in fine, do art. 28 da Lei n. 8.904/1994) ou de lançamento, arrecadação ou fiscalização de tributos e contribuições parafiscais, uma vez que os autos de infração ambientais têm natureza de sanção administrativa (não tributária).

No entanto, há a possibilidade de enquadramento das atividades desempenhadas pelos servidores designados à fiscalização ambiental como manifestação do poder de polícia administrativa, que, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, se subsome à hipótese normativa de incompatibilidade prevista no inciso V do art. 28 da Lei n. 8.906/1994 (“ocupantes de cargos ou funções vinculadas direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza”).

O conceito de “poder de polícia” aplicável à atividade administrativa do Estado está previsto e conceituado no art. 78 do Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/1966):

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

A manifestação do exercício do poder de polícia administrativa tem como propósito garantir o atendimento ao interesse público subjacente à intervenção do Estado na atividade econômica (v.g., exploração agropecuária, de garimpo etc.), que, na hipótese presente, está consubstanciado na necessidade de proteção e preservação do meio ambiente (art. 225 da CF).

Conforme reconhecido no voto-condutor do acórdão que definiu a tese de Tema 532 de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Ministro Luiz Fux, o exercício do poder de polícia se desenvolve em 4 (quatro) fases: (i) a ordem de polícia, (ii) o consentimento de polícia, (iii) a fiscalização de polícia e (iv) a sanção de polícia.

Tais manifestações do poder de polícia foram explicitadas na doutrina administrativista,3 citada no acórdão de julgamento do RE n. 633.782/MG:

A ordem de polícia é o preceito legal básico, que possibilita e inicia o ciclo de atuação, servindo de referência específica de validade e satisfação a reserva constitucional (art. 5º, II), para que se não faça aquilo que possa prejudicar o interesse geral ou para que se não deixe fazer alguma coisa que poderá evitar ulterior prejuízo público, apresentando-se, portanto, sob duas modalidades […], em que ambos os casos, a limitação é o instrumento básico da atuação administrativa de polícia. Essas modalidades, referem-se, portanto, respectivamente, a restrições e a condicionamentos. […] O consentimento de polícia, em decorrência, é o ato administrativo de anuência que possibilita a utilização da propriedade particular ou o exercício da atividade privada, em todas as hipóteses legais em que a ordem de polícia se apresenta sob a segunda modalidade: com a previsão de reserva de consentimento, a provisão pela qual o legislador exige um controle administrativo prévio da efetiva compatibilização do uso de certo bem ou do exercício de certa atividade com o interesse público. […] Segue-se, no ciclo, a fiscalização de polícia, a função que se desenvolverá tanto para a verificação do cumprimento das ordens de polícia, e não apenas quanto à observância daquelas absolutamente vedatórias, que não admitem exceções, como para constatar se, naquelas que foram consentidas, não ocorrem abusos do consentimento nas utilizações de bens e nas atividades privadas, tanto nos casos de outorga de licenças como de autorizações.
A utilidade da fiscalização de polícia é, portanto, dupla: porque, primeiramente, realiza a prevenção das infrações pela observação do adequado cumprimento, por parte dos administrados, das ordens e dos consentimentos de polícia; e, em segundo lugar, porque prepara a repressão das infrações pela constatação formal da existência de atos infratores. […] Finalmente, falhando a fiscalização preventiva, e verificada a ocorrência de infrações às ordens de polícia e às condições de consentimento, desdobra-se a fase final do ciclo jurídico em estudo, com a sanção de polícia – que vem a ser a função pela qual se submete coercitivamente o infrator a medidas inibidoras (compulsivas) ou dissuadoras (suasivas) impostas pela Administração.

As atividades desenvolvidas no curso da fiscalização ambiental, pelo respectivo Analista ou Técnico Ambiental investido na “atribuição” de Agente Ambiental Federal, perpassam por todo o ciclo de polícia, já que nas incursões in loco eles são responsáveis pela averiguação de irregularidades, aplicação de medidas cautelares (v.g., inutilização de maquinários, insumos etc.) e lavratura de autos de infração.

A natureza coercitiva de suas atividades justifica, ainda, o porte de armas de fogo pelos referidos agentes, haja vista a existência de grandes organizações criminosas na exploração ilegal do meio ambiente.

Nesse contexto, é possível identificar que os Analistas e Técnicos Ambientais, quando designados para a Fiscalização Ambiental, exercem poder de polícia administrativa a incompatibilizar o exercício concomitante da advocacia, nos termos da jurisprudência paradigmática do Superior Tribunal de Justiça.

Importa destacar, por outro lado, que enquanto não investidos da aludida atribuição, os Analistas e os Técnicos Ambientais, a exemplo dos integrantes do PECMA, podem exercer a advocacia apenas com o impedimento (limitação parcial) de atuarem em face da Fazenda Pública Federal.

Isso porque, conforme ressaltado, a atribuição de exercício do poder de polícia administrativa em matéria ambiental está restrita às hipóteses de fiscalização ambiental, para o qual não basta o exercício dos cargos de Analista e de Técnico Ambiental, mas sim a designação da atribuição de Agente Ambiental Federal pela autoridade máxima do IBAMA.

Dessa sorte, as previsões constantes nos arts. 4º, I, e 6º, parágrafo único, da Lei n. 10.410/2002 não podem ser suficientes para habilitar os seus ocupantes ao exercício ordinário do poder de polícia, mas tão somente compatibilizam o seu exercício caso haja designação específica das autoridades competentes.

Logo, é defensável a tese de que o poder de polícia administrativa não recai sobre o cargo de Analista e de Técnico Ambiental, mas sobre a função de Agente Ambiental Federal.

III – CONCLUSÃO

Em razão do exposto, as atribuições dos cargos de Analista Ambiental e de Técnico Ambiental, bem como dos integrantes do PECMA, apenas são incompatíveis com o exercício da advocacia se o seu ocupante estiver designado para a Fiscalização Ambiental. Nas demais hipóteses, é defensável que subsiste apenas o impedimento de advogarem contra a Fazenda Pública que os remunera.

Assim a opinião de quem abaixo subscreve.

TORREÃO BRAZ ADVOGADOS

Deixe um comentário